Como dialogar com "fascistas"?


A primeira pergunta é: queremos dialogar? Faz sentido pra mim/nós buscar o diálogo com as pessoas que se envolveram nos atos do dia 08 de janeiro em Brasília?

Pra mim parece fazer sentido pelo fato de que o caminho contrário ao diálogo vai cada vez mais aprofundar o abismo que existe entre “eles” e “nós”. E é exatamente esse abismo o terreno fértil para a violência. Quanto menos enxergamos o outro como humano, mais somos capazes de atos que nós denominamos fascismo, terrorismo, vandalismo…

Mas parece impossível dialogar nesse momento e tudo o que eu quero é punição, prisão, “para os fascistas, porrada…” (foi o que li em um cartaz em manifestação de ontem).

Se estou encontrando obstáculos ao diálogo, é que possivelmente a ação do outro me causa tanto desconforto, que perco a capacidade de reconhecer sua humanidade. Quando estou achando que é impossível dialogar, é porque a dor está grande demais. A dor de ver prédios públicos depredados, obras de arte destruídas, o espaço símbolo da democracia brasileira invadido e saqueado... Dói em você? Está doendo um bocado em mim.

E aqui vem um lembrete importante que nos ajuda a caminhar em direção ao “como”: julgamentos e rótulos são expressões trágicas de necessidades insatisfeitas. É porque temos Necessidades desatendidas ou ameaçadas que os enxergamos e nomeamos como terroristas, fascistas, vândalos… e não como manifestantes.

E é dessas Necessidades insatisfeitas que vem essa dor e esse desconforto: o aperto no peito, o nó na garganta, a tristeza, a indignação, a raiva...

Então, se a via do diálogo faz sentido pra mim/nós, precisamos dar espaço pra essas dores, receber empatia, escutar nossas necessidades. Por aqui, minhas necessidades de paz, segurança, de ser vista ficaram extremamente insatisfeitas. Quais as tuas necessidades ficaram ameaçadas ou desatendidas pelas atos do 08 de janeiro?

Somente quando somos suficientemente escutados, abrimos espaço em nós para escutar o outro. Só aí é possível o diálogo. A transformação social (e a manutenção da democracia) depende de cuidarmos dos nossos machucados.